A Polícia Penal de São Paulo vive hoje o seu momento mais
paradoxal. Por um lado, alcançamos o reconhecimento constitucional como força
de segurança pública, um título pelo qual gerações lutaram com suor e lágrimas.
Por outro, as galerias, as muralhas e os setores administrativos nunca
estiveram tão silenciosos em termos de camaradagem. A tropa está frustrada. O
desânimo, como uma névoa espessa, infiltrou-se nos raios e nas guaritas,
fazendo com que muitos percam a vontade de servir.
A Polícia que Nasceu "De Surpresa"
A falta de diálogo tornou-se uma regra. Em vez de uma
conversa franca no final do turno para aparar arestas, opta-se pelo papel frio
da denúncia, pela canetada que pode destruir a carreira de um parceiro. Quando
um policial penal se levanta contra outro por questões menores, quem vence é o
sistema, quem comemora é o crime.
A unidade prisional é um ambiente hostil por natureza; se não houver um pacto de confiança entre os que vestem a mesma cor de farda, o ambiente torna-se insuportável.
O Embate das Gerações: Antigões e Novatos
Um fenômeno preocupante tem sido o abismo entre os "antigões" e os recrutas. Precisamos falar sobre isso com honestidade.
De um lado, temos os veteranos. Muitos deles não são "encostados", como alguns novatos pensam. Eles são sobreviventes. São homens que trabalharam em épocas em que o sistema era terra de ninguém, que enfrentaram rebeliões sangrentas com quase nada nas mãos e que viram colegas tombar sem que houvesse uma manchete de jornal em sua homenagem.
Se hoje eles parecem cansados, é porque carregam nas costas o peso de décadas de descaso estatal. Eles não perderam a batalha; eles foram os engenheiros que abriram a trilha na mata virgem, enfrentando feras e intempéries para que, hoje, o recruta pudesse caminhar em uma estrada minimamente delineada.
Do outro lado, temos os novatos. Eles chegam com o vigor da juventude e o título de "Policial Penal" gravado no peito, querendo aplicar a teoria das academias. Muitas vezes, esse entusiasmo é lido pelos antigos como arrogância ou falta de respeito à hierarquia da experiência.
O resgate da vontade de servir passa obrigatoriamente pelo acolhimento. O veterano precisa entender que o novato é o braço forte que dará continuidade ao seu legado. O novato precisa entender que o veterano é a biblioteca viva que o manterá vivo no primeiro erro tático. Sem o respeito à história dos antigos e sem o apoio ao fôlego dos novos, a Polícia Penal de São Paulo será apenas um amontoado de indivíduos, e não uma instituição.
A Unificação dos Setores
Não existe "Polícia da Muralha" contra "Polícia do Pavilhão". Não existe "Escolta" contra "Inclusão". O que existe é a Polícia Penal de São Paulo.
A divisão interna entre turnos e equipes é uma ilusão perigosa. Quando um problema estoura na portaria, ele reverbera no corpo da guarda. Quando um abuso ocorre no pavilhão, ele compromete a segurança de quem está na muralha.
Precisamos resgatar a visão sistêmica da nossa profissão. A força do coletivo é a única coisa que impede o desmoronamento da nossa dignidade.
O presidente do Sindicato, Fábio Jabá, tem sido uma voz insistente nessa convocação. O sindicato tenta organizar a luta política, mas a luta moral e a luta ética acontecem no café do plantão, na troca de turno, no aperto de mão entre o colega que sai e o que entra.
Precisamos mudar para fazer Jus ao Título
Somos a maior Polícia Penal da América Latina. Isso não deve ser apenas um dado estatístico, deve ser um padrão de conduta. Fazer jus a esse título significa que devemos ser os maiores também em coesão, ética e irmandade.
Precisamos trazer de volta a vontade de servir, não pelo governo ou pela administração, mas por nós mesmos e pela sociedade que depende do nosso trabalho. Precisamos substituir o comunicado administrativo pelo diálogo.
Precisamos substituir o julgamento do colega pela cobertura de seu ângulo de visão.
Veteranos, voltem a ensinar com paciência. Novatos, aprendam com humildade. Todos nós, policiais penais, precisamos entender que a trilha foi aberta com sacrifício e que agora cabe a todos nós — unidos — desbravar o futuro.
A nossa força não está no calibre da arma ou no tamanho da muralha, mas na mão estendida ao parceiro de farda. Só assim seremos, de fato, a maior polícia. Não pelo número de presos que guardamos, mas pela grandeza dos homens e mulheres que compõem as nossas fileiras. União, força e honra: a Polícia Penal é uma só.
Edson Moura
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