A Realidade Invisível da Custódia Hospitalar: O Dia a Dia do Policial Penal nas Ruas e Hospitais de São Paulo
A missão do Policial Penal transcende os muros das unidades prisionais. Em um cenário de superlotação hospitalar e efetivos limitados, a operação de custódia de Pessoas Privadas de Liberdade (PPL) em hospitais é um desafio logístico e operacional que expõe as vulnerabilidades do sistema e a dedicação dos profissionais envolvidos.
Este texto busca expor a realidade crua dessas operações, os bastidores que a sociedade, e até mesmo a alta cúpula do sistema prisional, desconhecem.
O Cenário de Alto Risco em Hospitais Lotados
Hospitais, por sua natureza, são ambientes de vulnerabilidade controlada. A presença de uma PPL, muitas vezes de alta periculosidade, introduz um elemento de risco que exige uma operação de segurança robusta. No entanto, a realidade dos hospitais lotados de São Paulo impõe desafios adicionais.
Corredores congestionados, falta de leitos e a proximidade com o público em geral dificultam a manutenção de um perímetro de segurança eficaz. O Policial Penal, em sua custódia, precisa não apenas garantir que o detento não fuja, mas também proteger a si mesmo, à equipe médica, aos pacientes e visitantes.
A dinâmica é complexa. A PPL está sob cuidados médicos e, frequentemente, algemada a uma maca ou cama. A equipe de custódia deve manter vigilância constante, atenta a qualquer movimento suspeito, a tentativas de contato externo, ou mesmo a uma tentativa de resgate.
A tensão é constante, e o ambiente hospitalar, projetado para cura e tranquilidade, transforma-se em um teatro de operações de segurança.
A Questão do Efetivo e a Desguarnição dos Muros
A limitação de efetivo é um problema crônico do sistema prisional paulista. Em dias de custódia hospitalar, essa deficiência se manifesta de forma crítica. Para garantir que as equipes de custódia tenham um número mínimo de policiais para operar com segurança nos hospitais, muitas vezes é necessário "desguarnecer" os muros das unidades prisionais, especialmente aquelas que não dependem da base de escolta de Santana, que é responsável pelas escoltas e custódias na região metropolitana de São Paulo.
Não é incomum que, em um determinado dia, haja mais policiais penais de uma unidade prisional específica realizando custódias em hospitais do que protegendo o perímetro e os muros da própria unidade. Essa decisão, embora necessária para a segurança da missão hospitalar, cria uma vulnerabilidade na unidade prisional que não deve ser ignorada. É um equilíbrio tênue entre duas missões críticas, onde a segurança de uma é alcançada à custa da outra.
As Rendições e a Travessia da Cidade em Meio ao Caos Urbano
A rendição das equipes de custódia é outro ponto de tensão. A falta de viaturas disponíveis e a desorganização na escala de serviço podem transformar uma simples troca de turno em uma maratona logística. O policial que está saindo de um plantão de 12 ou 24 horas precisa ser substituído pontualmente, mas nem sempre a equipe de rendição está a postos.
Imagine a situação: um policial penal mora na Zona Leste de São Paulo e sai de casa às 15h para assumir seu plantão em Parelheiros, no extremo sul da capital, às 19h. Uma viagem de mais de 40 quilômetros em horário de pico. Ao chegar à unidade, ele é informado que deve assumir uma custódia em Guarulhos ou Santo André, cidades vizinhas, mas que exigem uma nova travessia da cidade.
Ele embarca na viatura às pressas, com a sirene e o giroflex ligados, tentando abrir caminho no trânsito caótico da metrópole. Mesmo com os dispositivos de emergência acionados, ele levará de uma hora e meia a duas horas para chegar ao posto de rendição no hospital.
Esse tempo de deslocamento não apenas atrasa a rendição, mas também aumenta a fadiga do policial que está saindo, que já está exausto de um plantão anterior.
A Realidade dos Protocolos Operacionais e o CTB
O Policial Penal está sujeito a protocolos operacionais rigorosos que exigem a condução das viaturas dentro dos limites do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), mesmo em situações de urgência. O uso de sirenes e giroflex confere o direito de prioridade no trânsito, mas não o direito de desrespeitar as leis de trânsito indiscriminadamente.
O servidor que excede a velocidade permitida, ou se envolve em um acidente, mesmo em missão, está sujeito a Processos Administrativos Disciplinares (PADs) e, em casos mais graves, a processos judiciais. Essa limitação legal, embora compreensível, cria um conflito entre a urgência da missão (como uma rendição atrasada ou um transporte de emergência) e o cumprimento da lei. O policial se vê em uma situação paradoxal: cumprir a missão com agilidade e correr o risco de ser punido, ou seguir o CTB à risca e atrasar a operação.
As Longas Remoções para o Interior e a Exaustão
Além das custódias hospitalares na capital, as remoções de PPL para unidades prisionais no interior do estado são rotineiras e igualmente desafiadoras.
São viagens de centenas de quilômetros, que levam 14, 15 horas ininterruptas de direção. A equipe de escolta, geralmente composta por quatro policiais, tem um motorista fixo a quem a viatura foi acautelada, impedindo que outro integrante da equipe assuma a direção, necessitando aqui um grande senso de companheirismo e confiança para flexibilizar o procedimento, e passar a direção a outro combatendo o sono, a fadiga e mantendo a atenção total na PPL sob custódia no Veículo de Transporte de Presos (Bonde) que vai à frente da viatura.
Essas longas viagens testam os limites físicos e mentais dos servidores. A falta de infraestrutura de apoio nas estradas, a monotonia da estrada e a responsabilidade de transportar indivíduos perigosos criam um ambiente de estresse constante.
Ao final da missão, a exaustão é inevitável, mas a satisfação do dever cumprido prevalece.
Orgulho, Vibração e o Dever Cumprido
Toda essa realidade, com seus desafios e vulnerabilidades, não é uma reclamação, mas um retrato fiel do dia a dia do Policial Penal.
Faz parte do trabalho, dos bastidores que a sociedade, e infelizmente muitos diretores e secretários que nunca executaram uma missão de escolta ou custódia, desconhecem.
O Policial Penal vibra com a missão. Há um orgulho imenso em executar o trabalho, no limite das possibilidades, garantindo a segurança pública mesmo diante das adversidades.
É essa dedicação, essa resiliência e esse profissionalismo que definem o que é ser Policial Penal. É uma profissão que exige mais do que força física; exige inteligência, logística, paciência e, acima de tudo, um compromisso inabalável com a segurança da sociedade.
Este material, ao integrar o "Manual Jurídico do Policial Penal" de Edson Moura, serve para jogar luz sobre essa realidade invisível, fornecendo subsídios jurídicos para que os profissionais possam executar suas missões com mais segurança e conhecimento de seus direitos e deveres.
Edson Moura

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