A PRESENÇA COMO ATO DE FORÇA:
COMPLEIÇÃO FÍSICA E POSTURA NO USO DIFERENCIADO DA FORÇA PELO POLICIAL PENAL
O Paradigma da Prevenção Ativa
No contexto do sistema
penitenciário moderno, a segurança não se resume à aplicação de sanções ou ao
uso de armamentos. A segurança é, primordialmente, uma construção de
percepções. O Policial Penal, ao adentrar o raio habitacional (Pavilhão), o pátio de sol, à inclusão para retirada de
detentos que serão transportados, não carrega apenas seu distintivo e seus equipamentos;
ele carrega sua própria imagem como o primeiro instrumento de controle estatal.
O Uso Diferenciado da Força (UDF)
é frequentemente ensinado como uma escada que começa na "presença
física". No entanto, raramente se disseca o que constitui essa presença.
Neste Volume do Manual Jurídico do Policial Penal, tratamos a compleição física
e a postura não como vaidade estética, mas como ferramentas jurídicas de
preservação da integridade física. Um policial penal bem condicionado e
posturado reduz a probabilidade de um confronto físico, o que, por
consequência, reduz a responsabilidade civil e administrativa do Estado e do
próprio servidor por eventuais danos causados em combates aproximados.
A Compleição Física como Primeiro Nível de Dissuasão
A psicologia do ambiente
prisional é regida por dinâmicas de poder e leitura de vulnerabilidades. O
custodiado, ao planejar uma subversão da ordem ou uma agressão, realiza uma
análise de risco instintiva.
A necessidade de o policial estar
em boas condições físicas é uma questão de economia de força. Um policial penal
que demonstra vigor, agilidade e força funcional transmite a mensagem
silenciosa de que o custo da resistência será alto.
Muitas situações de crise — desde
um princípio de motim até uma recusa de cela — são minimizadas ou
"vencidas" antes mesmo de uma palavra ser dita. A imagem de um
policial imponente atua no subconsciente do agressor, ativando mecanismos de
autopreservação que o levam à obediência. Em termos jurídicos, a compleição física
adequada é o cumprimento do princípio da Proporcionalidade, pois evita que o
agente precise saltar níveis no escalonamento da força (como o uso de tonfa ou
agentes químicos, armas com munição de elastômero ou em último caso, munição
letal) por não ter capacidade física de sustentar sua autoridade apenas com a
presença.
Se o corpo é o instrumento, a
postura é a técnica. A postura do Policial Penal deve equilibrar a autoridade
com o profissionalismo, evitando os dois extremos perigosos: a passividade (que
convida à agressão) e a agressividade gratuita (que gera retaliação).
O Olhar Direto: Vigilância sem Psicopatia
O contato visual é a espinha
dorsal da postura policial. O "olhar direto" mencionado nesta obra
não deve ser confundido com o encarar desafiador, típico de confrontos de
gangues ou transtornos antissociais.
O Olhar Profissional: É um olhar de
escaneamento e foco. Ele comunica que o policial está ciente de tudo o que
ocorre ao seu redor. Ao focar em um indivíduo, o policial deve manter os olhos
fixos, mas com a face serena.
O Erro da Intimidação Excessiva:
Olhar de forma maníaca ou descontrolada ("olhar de psicopata")
sinaliza instabilidade emocional. O custodiado não teme o instável; ele o
testa. O policial que parece ter perdido o controle sobre suas próprias emoções
perde a autoridade moral da função.
A Postura de Prontidão
A coluna ereta, o peito aberto e
as mãos em posição de "entrevista" (acima da linha da cintura,
prontas para defesa ou verbalização) compõem a geometria da autoridade. Ombros
caídos ou mãos nos bolsos sinalizam desleixo, o que é interpretado como uma
brecha na segurança da unidade.
O Segundo Contato: A Verbalização Técnica
Quando a presença física não é
suficiente para garantir a obediência, o Policial Penal avança para o segundo
nível do UDF: a verbalização.
O erro mais comum em situações de
estresse é o policial gritar de forma histérica. O grito descontrolado é um
sinal de medo e perda de domínio da situação.
Voz Firme e Grave: A autoridade
reside no timbre e na cadência. Uma voz firme, projetada pelo diafragma,
comunica clareza e determinação.
A Psicologia do Volume: Ao manter
o tom de voz controlado (mesmo que elevado para ser ouvido), o policial força o
interlocutor a baixar seu próprio nível de ruído para entender a ordem. O grito
deve ser reservado para ordens de impacto momentâneo, mas a gestão do conflito
é feita pela palavra firme.
Infraestrutura e Capacitação: A
Implementação de Academias Setoriais
A doutrina do Uso Diferenciado da
Força (UDF) é inócua se o Estado não fornecer os meios para que o servidor
mantenha o "instrumento" de trabalho — seu próprio corpo — em
condições de pronto-emprego. A eficácia da presença física, discutida nos
capítulos anteriores, depende de uma política institucional de saúde e treinamento
contínuo.
A implementação de academias de
musculação e treinamento funcional dentro das unidades prisionais, ou em
complexos regionais, não deve ser vista como um privilégio, mas como um
investimento em segurança passiva.
Policiais penais treinados
possuem melhor tempo de reação e maior resistência ao estresse. Isso reduz o
número de afastamentos por lesões em serviço ou doenças psicossomáticas. Diferente
de uma academia comercial, a academia institucional deve focar na "força
funcional". Isso inclui o treinamento de explosão, técnicas de
imobilização (jiu-jitsu, judô) e condicionamento cardiorrespiratório para
situações de contenção em ambientes confinados e sob altas temperaturas.
Reconhecendo as limitações
orçamentárias para a construção imediata de centros de treinamento em todas as
unidades, o Estado deve fomentar parcerias com academias particulares. Através
de editais de credenciamento ou termos de parceria, o policial penal pode
usufruir de estruturas privadas com custos subsidiados ou isenção de taxas. Para
o setor privado, a presença de policiais treinando em seus estabelecimentos
aumenta a segurança orgânica do local. Para o Estado, garante-se um servidor
apto sem o custo imediato de manutenção de grandes infraestruturas.
O Sistema de Incentivos e a Valorização do Treinamento Extracurricular
Historicamente, forças de elite e
instituições como a Polícia Militar e a Polícia Federal já implementaram
mecanismos que reconhecem o esforço do servidor que se mantém treinado fora do
horário de expediente. No âmbito da Polícia Penal, essa transição é fundamental
para a consolidação da carreira.
Para que o treinamento após o
horário de trabalho seja efetivo, ele precisa ser incentivado por resultados
tangíveis na carreira. Incentivos Pecuniários e Promocionais: A exemplo de
outras forças, a aprovação anual em um Teste de Aptidão Física (TAF) de alto
rendimento poderia gerar pontuação adicional para fins de promoção por
merecimento ou até mesmo um "Adicional de Prontidão Operacional".
Aptidão como Requisito para
Grupos Especializados: O acesso a grupos de intervenção (como o GIR ou
similares) deve estar condicionado à manutenção rigorosa de índices físicos,
criando uma cultura de excelência que transborda para o restante da tropa.
Conforme discutido anteriormente,
o trabalho na folga deve ser remunerado via DEJEP. No entanto, o treinamento na
folga deve ser encarado como um investimento na própria vida e na segurança dos
companheiros.
Horas de Treinamento como Carga
Horária: Uma proposta inovadora para o Manual Jurídico é a computação de horas
comprovadas em academias conveniadas como parte de um banco de horas para
capacitação, ou a oferta de cursos de defesa pessoal técnica que somem pontos
no currículo funcional do servidor.
A compleição física e a postura
do Policial Penal são, em última análise, a materialização da autoridade
estatal. O Estado tem o dever de não apenas exigir esse padrão, mas de prover
os meios (academias e parcerias) e os incentivos (promoções e bônus) para que o
servidor não sucumba ao sedentarismo e ao estresse da atividade. O Policial
Penal do século XXI não é um mero "chaveiro", mas um operador tático
e jurídico que entende que seu corpo e sua voz são as primeiras ferramentas
para a manutenção da paz social dentro do sistema penitenciário.
A integração destes conceitos no
cotidiano das unidades prisionais reduzirá drasticamente o uso da força física
real, protegendo o policial de processos administrativos e preservando os
direitos fundamentais do custodiado através do controle absoluto do ambiente.
Edson Moura
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